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Das personalidades marginalizadas
08/02/2016 17:00 em Book Review

 

 

Aos 34 anos, Maikel de Abreu começou aos oito desenhando e argumentando histórias em quadrinhos. “Dobrava 10 folhas de ofício pela metade e grampeava. Resultava em 40 páginas para elaborar histórias todos os meses”, lembra.

Em seguida, já adolescente, enveredou pelos contos e, ainda mais tarde (se é que se pode afirmar dessa maneira), passou a escrever no blog inter-urbanos, em parceria com Cesar Mateus. “Dali saíram os contos de Couro ilegítimo e outros contos”, livro editado pela Modelo de Nuvem, no qual dedica boa parte da produção “a personalidades marginalizadas no bairro onde nasci, o Cruzeiro”, comenta.

O técnico em enfermagem e instrumentação cirúrgica também estudou Jornalismo (ainda por concluir) e tem, recentemente, se inspirado em autores como Ian McEwan, Roberto Bolaño, Alan Pauls, João Antônio, Graciliano Ramos e Juan Rulfo. “Sou um entusiasta da literatura contemporânea, leio muitos autores da minha geração. Troco ideias com alguns via Facebook, inclusive.”

A profusão de novos autores e de editoras pequenas – e ele cita a Patuá, a Sete Letras e a Oito e Meio – figurando nos prêmios literários importantes no Brasil e ganhando visibilidade, o nascimento da Flipobre (feira literária paralela à feira oficial de Parati, no Rio de Janeiro), manifestação muito espontânea dos escritores fora do mainstream, “estão entre as coisas mais bacanas que testemunhei no ambiente das redes sociais”.

 

 

Depois de publicar o livro em 2012, afastou-se do meio. “Tive um hiato de dois anos. Nesse tempo li, comecei muitos textos, desisti de muitos (textos), maturando minha relação com a literatura.” Em 2014, a também escritora Natália Borges Polesso escolheu o livro Couro Ilegítimo e outros contos como tema de um artigo acadêmico, intitulado “Perspectivas: as cidades de couro ilegítimo”.

De volta às atividades literárias, Maikel publicou, ainda em 2014, o conto Às noites de distância, na coleção Formas breves, da E-Galáxia, edição que reuniu autores consagrados e autores estreantes do Brasil. “O conto é um relato em primeira pessoa de um vigia de um condomínio horizontal que mantém uma estranha relação com uma das moradoras”, descreve ele.

 

 

 

 

 

 

E, assim como o livro virou artigo acadêmico, o conto publicado na E-Galáxia , e que também foi traduzido para o espanhol para a revista 2384 – 

 ao lado de autores como Ricardo Lísias,  Antõnio Xerxeneski e João Antonello Carrascoza – será adaptado para um segundo curta-metragem (o primeiro foi o conto Finados, que ganhou novo título, Três quartos e um terço, produção elaborada durante a oficina do SEDA Caxias), projeto contemplado pelo Financiarte.

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Trecho do conto Às noites de distância, publicado na coleção Formas breves

 

Perto das oito começou a agitação. Cansei, mesmo à distancia, de abrir e fechar os portões para as visitas. Além disso, não tive paz enquanto boa parte das crianças com seus convidados quase colocava abaixo a casinha do playground. Adultos passavam com taças de champanhe, as pessoas me desejavam feliz natal com certo pesar, talvez sensibilizadas pelo fato de eu estar longe da família na ocasião. Ganhei duas garrafas de vinho do síndico e uma caixa de bombons de uma das crianças. Não consegui sentir nenhum tipo de gratidão. Todos eles pareciam pessoas de qualquer outra espécie, menos da minha. Abandonei a amargura e me distraí com os pequenos que brincavam no parquinho. A brisa trouxe algum cheiro que lembrou a infância. Desejei de forma absurda ser alguma daquelas crianças e, dali em diante, pegar o caminho certo na vida.”

 

 

 

 

 

 

Dinarte Albuquerque Filho

Jornalista

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